Jefferson Magno Costa
Ao se aproximar do Oceano Atlântico, o rio Amazonas divide-se à direita e à esquerda. Nesse trecho alarga-se muito e recebe, à direita, o nome de rio Pará, formando o amplo espaço aquático da baía de Marajó, desaguando em seguida no oceano.
Para alcançar Belém, capital do Estado do Pará, os navios vindos do Atlântico penetram a baía e navegam as águas em sentido contrário ao curso do rio, aproximando-se do porto da cidade pela margem esquerda.
No dia 19 de novembro de 1910, dezenas de pessoas acompanhavam as manobras de navegação de um grande navio que se aproximava do Cais de Belém. A realização de várias atividades portuárias naquela manhã não permitiu que o navio Clement atracasse no cais.
Por esse motivo, um barco foi enviado para transportar os passageiros do navio que chegara de Nova Iorque e acabara de lançar âncora ao largo do porto.
Quando o barco proximou-se do cais trazendo os passageiros, um grupo de homens, mulheres e crianças começou a acenar, a sorrir, a gritar, a bater palmas, a pronunciar nomes, numa efusão de alegria autenticamente brasileira.
Ao desembarcarem, os passageiros viram-se rodeados pelos parentes e amigos, que, entre palavras, sorrisos e abraços, ajudavam-nos a levar a bagagem.
Quando quase todos já haviam desembarcado, dois homens, empunhando firmemente as alças de suas malas, pisaram solenemente na plataforma do cais. Não havia ninguém à espera deles. Porém, o desembarque desses dois estrangeiros em solo brasileiro, numa clara manhã de novembro, terá em breve um grandioso significado para a história do Movimento Pentecostal no Brasil.
Nesse momento, os pés desses dois homens estão a pisar firmemente o solo de um país que eles ainda desconhecem, mas em breve aqueles pés tornar-se-ão cansados e feridos, porém formosos sobre os montes, pedras, selvas, espinhos e cidades brasileiras, quando os dois missionários saírem a anunciar as Boas-novas de salvação.
Aqueles dois homens ainda não são capazes de pronunciar nenhuma palavra da língua portuguesa, mas são capazes de falar em mistérios com Deus. Ambos não refletem em seus semblantes a alegria que se vê estampada nos rostos amorenados dos homens, mulheres e crianças que falam alto, se abraçam e se afastam do cais, mas nos corações daqueles dois estrangeiros arde a chama do Espírito Santo, um fogo suficiente para produzir cânticos e júbilos tão intensos, que em breve irromperão nos lábios e nos corações das primeiras almas resgatadas das trevas para fazerem parte do grande rebanho da Assembleia de Deus no Brasil.
Nascidos na Suécia, eles embarcaram em Nova Iorque naquele navio desconfortável que acabara de chegar a Belém. Além da grande fé que trazem nos corações, e da pouca bagagem, eles dispõem de uma quantia tão pequena de dinheiro, que não lhes permite aceitar que os carregadores transportem suas malas.
Um deles é forte, a pele clara, os cabelos e bigodes escuros, o olhar sereno e decidido. O outro é loiro, alto, de olhos azuis, com as pontas do bigode dobradas para cima, a olhar com firmeza e curiosidade para todas as coisas. O de cabelos escuros chama-se Daniel Berg. O outro, Gunnar Vingren. Ambos foram enviados por Deus para trazer o Pentecoste ao Brasil.
Quando ainda estavam em Nova Iorque, Daniel e Vingren haviam decidido comprar passagens de terceira classe, a fim de economizarem o pouco dinheiro de que dispunham.
Consequentemente, quase não puderam se alimentar durante a viagem, pois a comida que serviam aos passageiros dessa classe era de má qualidade. Por esse motivo, ao se distanciarem do cais, a primeira resolução que tomaram foi localizar um restaurante, quando então, e pela primeira vez após muitos dias de viagem, puderam servir-se de uma refeição digna, e entrar em contato com o cardápio brasileiro.
Após saírem do restaurante, Vingren perguntou a Daniel:
- E agora Daniel, para onde vamos?
- Vamos subir por esta rua, Vingren, e certamente Deus nos orientará sobre o que devemos fazer.
A CIDADE ETERNA
Carregando suas malas, os dois embaixadores do Deus Altíssimo começaram a subir lentamente a rua. Tudo o que viam ali era infinitamente diferente do que tinham visto nos Estados Unidos e na Suécia. As torres altas das belas casas em estilo colonial contrastavam com os casebres extremamente pobres que circundavam a cidade.
Ruas pedregosas e poeirentas se ramificavam em várias direções perpendiculares ao rio. Transitando normalmente por essas ruas, vários leprosos, que haviam acorrido à Belém ao ouvirem dizer que naquela cidade fora descoberta a cura da lepra, expunham ao olhar dos transeuntes os seus corpos mutilados pela doença. Ao contemplarem esse quadro doloroso, um sentimento de compaixão e de amor invadiu os corações dos missionários.
Enquanto caminhavam observando a paisagem que se estendia adiante dos seus olhos, é provável que Daniel Berg e Gunnar Vingren tenha-se lembrado de suas cidades natal. Certamente, pouca coisa havia de comum entre aquelas duas cidades da Suécia e a cidade de Belém.
Porém, ao contemplarem aquelas ruas e aqueles homens e mulheres curiosos, muitos deles pobremente vestidos, a andarem para lá e para cá como ovelhas desgarradas que não têm pastor, os missionários devem ter-se lembrado dos montes, das fontes abundantes e dos lagos cristalinos existentes nas cidades onde nasceram, cidades montanhosas, lugares prediletos dos reis da Suécia para a realização de caçadas.
E certamente naquela hora desejaram falar àquele povo da existência de um lugar muito diferente de Belém, e mais belo e infinitamente mais vasto do que toda a Suécia. Um lugar onde não há ruas pedregosas e acidentadas, nem casas mal iluminadas e pobres, ou pessoas sem mãos, sem orelhas, sem nariz e sem dedos a andar sem rumo.
Eles lhes falariam da Jerusalém Celestial, a pátria eterna de todos os que aceitam a Jesus como Salvador, e guardam sua Palavra no coração. A Cidade das Doze Portas, em cujas ruas de ouro e cristal, em tempo sempre sereno e claríssimo, brilha o Sol da Justiça. Anunciariam a existência das amplíssimas regiões celestiais, onde, quando se iniciar o jubileu das eternas bem-aventuranças, os salvos e remidos pelo sangue do Cordeiro viverão eternamente contemplando a Face adorada de Jesus.
O PRIMEIRO INDÍCIO DA EXISTÊNCIA DE UM EVANGÉLICO EM BELÉM
Após andarem durante algum tempo, os missionários resolveram sentar-se em um banco de jardim, e ali fizeram uma oração, pedindo a Deus que os fizesse encontrar um evangélico.
Ao concluírem a oração, sentiram desejo de voltar na direção do porto. Uma família que também viajara no navio Clement, e falava inglês, os encontrou e lhes indicou um hotel. Ali os missionários entraram em contato com outra pessoa que também falava inglês, e esta informou que conhecia um evangélico naquela cidade, mas não sabia onde morava.
Já era noite. Os missionários trataram então de arranjar um quarto naquele hotel. Ao fazerem um balanço de suas finanças, descobriram que só dispunham de quatro dólares e alguns cêntimos. Não ficaram nada surpresos ao saber que um quarto para duas pessoas custava 16 mil réis (o equivalente, na época, a quatro dólares).
Com o restante pagariam a passagem de bonde no dia seguinte.
Ao se recolherem para dormir, Vingren deparou-se com um jornal jogado no chão. Certamente o hóspede anterior o esquecera ali.
Apesar de não entender nada da língua portuguesa, o missionário passou a folheá-lo assim mesmo. Súbito, gritou para Daniel:
- Aqui está, Daniel, a resposta de Deus! O redator deste jornal é o irmão Justus Nelson, um pastor metodista que eu conheci na América do Norte. Amanhã nós iremos procurá-lo, e ele certamente nos dará as orientações de que necessitamos.
Aquela noite Daniel Berg e Gunnar Vingren elevaram suas vozes em oração ao Onipotente e misericordioso Deus, e agradeceram-lhe o cuidado e o amor que Ele estava tendo com suas vidas, e a direção e a paz que enchia os seus corações. Confiantes em Jesus, o sublime e seguro guia de suas almas, adormeceram.
HOSPEDADOS NO PORÃO DA CASA DO PASTOR BATISTA
No dia seguinte, após pedirem que Deus os conduzisse, tomaram o café da manhã e saíram à procura do pastor metodista. Ao chegarem à casa do irmão Justus Nelson, este os recebeu alegremente. Após contar-lhes as muitas experiências que vivera ali, o irmão Nelson tratou de conduzir os missionários ao pastor batista local, irmão Erik Nilson, também de origem sueca.
Erik Nilson recebeu alegremente os seus compatriotas e irmãos na fé. Quando soube que estavam hospedados em hotel, convidou-os a morar no porão da igreja, e a auxiliá-lo nos trabalhos da Igreja Batista, em Belém, situada na Rua João Balby, no. 406.
Daniel e Vingren aceitaram o convite. Voltaram para apanhar a pouca bagagem que lhes pertencia, e passaram a morar em um corredor escuro e abafado.
A notícia de que dois missionários haviam recentemente chegado dos Estados Unidos alcançou rapidamente as quatro igrejas evangélicas existentes em Belém. E logo Daniel e Vingren passaram a visitar essas igrejas, pois todos os irmãos queriam vê-los e ouvi-los.
Em uma dessas igrejas, os missionários cantaram em duas vozes o hino Jesus Christ is made to me, all I need, all I need (Jesus Cristo é tudo para mim, tudo o que eu necessito, tudo o que eu necessito), e o poder de Deus caiu maravilhosamente sobre os irmãos!
Já em suas primeiras pregações, Daniel e Vingren passaram a falar acerca do batismo no Espírito Santo. Este assunto era novidade para quase todos os crentes batistas, e para os das outras denominações também. Porém, alguns deles já tinham ouvido ou lido anteriormente acerca do assunto, mas não sabiam que a promessa do batismo com o Espírito Santo era também para eles. Após a chegada dos missionários, o número de ouvintes da Palavra de Deus aumentou rapidamente.
Antes, nem os cultos aos domingos conseguiam encher a metade do templo. Quando Vingren e Daniel Berg passaram a tomar parte ativa nos trabalhos, o templo da igreja Batista encheu de tal maneira que muita gente teve de assistir aos cultos em pé.
CONHECENDO OS SEGREDOS DA SELVA
Um mês após haverem chegado ao Pará, os missionários foram convidados pelo irmão Adriano Nobre, que era membro da Igreja Presbiteriana em Belém, para uma viagem à casa dos seus pais. Os pais de Adriano moravam em uma localidade chamada Boca do Ipixuna. Ali os seringueiros extraíam a borracha.
Durante três dias seguidos, Vingren e Daniel viajaram de barco por diversos rios. Foi então que puderam entrar em contato com aquela selva imensa, com árvores que pendiam seus frondosos galhos para dentro dos rios; com belíssimas orquídeas e grandes cipós arqueados como arcos de triunfo, a saudar o avanço dos dois servos de Deus pelos mistérios da selva!
Árvores arrancadas pelas águas desciam lentamente na correnteza. Derivando-se dos rios maiores, dezenas de afluentes abriam-se em leque, serpenteando por entre a floresta, formando ilhas, alagadiços e igapós. Abrindo o vôo, bandos de pássaros cortavam o límpido e sereno céu sobre as selvas.
No alto das árvores, subitamente, macacos pulavam com agilidade de um galho para outro. Havia crocodilos nas margens dos rios, borboletas coloridas que, aqui e ali, voavam no ar onde se respirava o perfume agreste das flores tropicais.
Mas também havia as pragas. O carapanã (mosquito) atacava ao anoitecer e só dava tréguas pela manhã, quando era substituído pela mutuca (espécie de mosca sanguessuga).
Curiosos e maravilhados diante do mundo de beleza e mistério que se estendia diante dos seus olhos, os missionários ouviam, durante o dia, cantos, silvos, urros e estalidos que contrastavam com o silêncio que, à noite, caía sobre os animais adormecidos e ocultos entre as gigantescas árvores.
Viajando por rios estreitos e largos, os missionários puderam contemplar a beleza daquelas noites sossegadas, noites em que, no plenilúnio, o majestoso luar se apossa do escuro azul do céu, e as estrelas brilham à flor dos rios como um bando de aves de prata.
Quando se aproximaram da localidade onde moravam os pais de Adriano Nobre, Vingren e Daniel viram, às margens dos rios, casas erguidas sobre pilares de madeira - as palafitas. Ficaram felizes ao saber que no interior de algumas delas moravam famílias evangélicas.
Ali participaram de pequenas reuniões de oração, onde puderam pregar a Palavra de Deus e cantar em português alguns hinos decorados. Os missionários comeram do que havia de melhor no interior daqueles humildes lares: farinha, arroz, feijão sem sal, carne seca e café sem leite. No final de um mês e meio, retornaram a Belém.
A PRIMEIRA PESSOA NO BRASIL BATIZADA COM O ESPÍRITO SANTO
Para obterem dinheiro e poderem pagar um professor de português, ficou combinado que Daniel voltaria a exercer o ofício de fundidor que aprendera nos Estados Unidos, enquanto Vingren estudaria durante o dia. À noite, Vingren ensinaria a Daniel o que aprendera.
E assim, com muito esforço, aprenderam o português. O salário de 12 mil réis por dia proporcionou aos missionários condições de se manterem relativamente bem e poderem comprar Bíblias e Novos Testamentos nos Estados Unidos.
Os irmãos passaram a visitar a moradia de Vingren e Berg, e no decorrer do tempo, comprovaram que eles eram homens de oração e de fé, e viviam o que pregavam. Nessa ocasião, os missionários ficaram sabendo que muito antes de sua chegada a Belém, os diáconos da igreja Batista estavam orando todos os sábados, pedindo a Deus que enviasse mais missionários ao Brasil.
Portanto, Daniel e Vingren eram considerados por esses irmãos como resposta às suas orações. Além do mais, o fato de os dois missio¬nários viverem naquele porão em condições tão precárias e continuarem sadios e dispostos a pregar a Palavra de Deus a qualquer hora do dia ou da noite, era uma indiscutível prova de que Deus os enviara.
Os irmãos que se reuniam na moradia dos missionários passaram a receber com mais assiduidade ensinamentos acerca do batismo com o Espírito Santo e da cura divina. No quartinho existente naquele porão, e nos lares de alguns crentes da Igreja Batista, vários cultos passaram a ser realizados.
Num desses cultos, Gunnar Vingren perguntou a uma irmã que sofria de câncer nos lábios, se ela estava disposta a abandonar todos os remédios que usava e crer que Jesus a podia curar naquele momento. Ela respondeu que sim. Os irmãos oraram e o Senhor a curou imediatamente!
Aquela irmã chamava-se Celina de Albuquerque, e nos cultos de adoração que se seguiram, ela começou a pedir a Jesus o batismo com o Espírito Santo.
Naquela mesma semana, após o culto de quinta-feira, acompanhada da irmã Nazaré, ela continuou buscando a face do Senhor, e à uma hora da madrugada, Jesus a batizou com o Espírito Santo e com fogo, e ela falou durante mais de duas horas em outras línguas com Deus! Segundo o que documentou Gunnar Vingren, "foi a primeira operação do batismo com o Espírito Santo feita pelo Senhor Jesus Cristo em terras brasileiras".
No outro dia, a irmã Nazaré, que vira a irmã Celina ser batizada, relatou aos demais membros da igreja tudo o que testemunhara.
Naquele mesmo dia, orando em companhia de outras irmãs no local onde os missionários realizavam cultos de oração, a irmã Nazaré também foi batizada com o Espírito Santo, e cantou um hino no Espírito!
Com exceção de um evangelista e da esposa de um diácono, todos os demais irmãos que testemunharam a manifestação do poder de Deus na vida daquelas duas irmãs, creram que tudo aquilo era obra do Espírito Santo.
A VISITA DO PASTOR BATISTA E SUAS CONSEQUENCIAS
Certa noite, quando vários irmãos reunidos no porão onde moravam os missionários, oravam e cantavam hinos de louvor a Deus, o pastor Erick Nilson, para surpresa de todos, ali apareceu. Gunnar Vingren e Daniel Berg já sabiam que ele não apoiava a doutrina do batismo com o Espírito Santo.
Nem ele nem Raimundo Nobre, que estava estudando para evangelista. Sabiam também que o pastor Nilson, logo que chegara ao Brasil, começara a pedir que Deus cumprisse nele essa promessa.
Depois de catorze dias buscando o batismo, suplicando em todas as horas disponíveis do dia e da noite que o Senhor o revestisse de poder, finalmente Deus começou a derramar poder sobre ele, porém sua esposa, amedrontada, pediu-lhe que parasse com ''aquilo", e não permitiu que ele recebesse a grandiosa promessa. A partir de então, Nilson tornou-se inimigo da doutrina pentecostal.
Quando o pastor entrou no recinto, os irmãos se levantaram para saudá-lo. Fez-se total silêncio no porão. Os missionários convidaram-no a participar do culto improvisado, mas ele recusou. Diante da surpresa e do ligeiro temor de alguns irmãos, o pastor identificou com o olhar a cada um dos crentes ali presentes, e disse:
- Vejo que chegou a hora de tomar uma decisão. Há algum tempo venho observando discussões acerca de certas doutrinas que não admito como certas. Isto nunca aconteceu desde que comecei a pastorear a igreja aqui em Belém. Sei, contudo, que os responsáveis por essa situação são os irmãos Gunnar Vingren e Daniel Berg, que, possuídos de um sentimento separatista, têm semeado dúvidas e inquietação no seio da igreja.
- Irmão Erik Nilson - respondeu imediatamente Gunnar Vingren - Deus é testemunha de que não estamos aqui possuídos de nenhum sentimento separatista, e nem desejamos a desunião dos irmãos. Pelo contrário, queremos que todos sirvamos a Deus unidos no mesmo Espírito. Porém, queremos aproveitar também este momento para tornar a afirmar que, se todos alcançarmos a experiência do batismo com o Espírito Santo, jamais nos dividiremos; seremos mais do que irmãos, seremos uma só família.
- Sei que a Bíblia fala acerca do batismo com o Espírito Santo e da cura divina - respondeu o pastor Nilson, já alterando o timbre da voz. - Porém, essas coisas foram para aquele tempo. Seria um absurdo que pessoas bem informadas viessem a acreditar que isso possa acontecer em nossos dias. Hoje, temos que ser realistas e procurar não nos envolver com sonhos e falsas profecias. Quanto aos senhores missionários, se não vos corrigirdes e reconhecerdes que estais errados, é meu dever comunicar a todas as igrejas Batistas o que está acontecendo, para que se previnam contra as vossas falsas doutrinas.
Gunnar Vingren e Daniel Berg ouviram tudo aquilo com a serenidade que os caracterizava. Após todos ficarem em silêncio por alguns instantes, Vingren tornou a falar. Afirmou lamentar muito que assuntos de tal importância estivessem motivando uma discussão de caráter pessoal. Falou também que todos ali eram servos de Deus, e pregavam acerca do mesmo Deus. E finalmente, concluiu:
- Na minha opinião, somos colegas, e não concorrentes. Saber quem leva as almas a Deus é coisa secundária. O que importa é que o número de almas salvas aumente cada vez mais. Não direi que o irmão não esteja na verdade, mas afirmo que não achou toda a verdade. Nós pregamos a verdade do batismo com o Espírito Santo e da cura divina, que Jesus pode realizar ainda em nossos dias.
Após ouvir o que Vingren dissera, o pastor Erik Nilson encarou os presentes. Todos os irmãos permaneciam em silêncio absoluto. Fitando os rostos impassíveis e serenos, o pastor olhou firmemente para um diácono - um dos mais antigos membros da Igreja Batista em Belém - e esperou encontrar nele o apoio que até então não encontrara em nenhum dos irmãos presentes. Mas foi para surpresa do pastor Nilson que esse irmão, em nome dos demais, disse:
- Agora somos pentecostais!
Pedindo inicialmente que o pastor Nilson não os considerasse traidores do Evangelho, o diácono afirmou que os irmãos reunidos ali jamais tinham tido tanta fé. A explicação para aquela mudança era que eles haviam encontrado a fé e o poder do Espírito Santo!
- Não temos queixa, pastor - falou o diácono - de antes o irmão não nos haver falado acerca destas verdades, pois o senhor as desconhece e, não as conhecendo, não nos poderia ensiná-las. Porém desejaríamos que o irmão também recebesse estas bênçãos de Deus, a fim de nos entendermos melhor, e podermos sentir a mesma comunhão uns com os outros.
Todos os irmãos aqui presentes encontram-se em um plano mais elevado, e mais perto do Céu. O irmão disse que é realista; pois bem, vou citar agora alguns casos reais ocorridos entre nós, algumas provas concretas do poder de Deus em nosso meio.
O diácono passou a relatar vários casos de cura ocorridos entre os irmãos. Certa irmã, que andava amparada por duas muletas, ouvia a pregação dos missionários acerca da cura divina, e, orando com fé, fora completamente curada!
A irmã ainda usava as muletas, mas dependuradas na parede de sua casa, em local bem visível, para que todos vissem de que modo maravilhoso Jesus a curara! O caso da irmã Celina também foi citado, juntamente com outros.
- Caro pastor, - concluiu o diácono - não queremos nem podemos acusá-lo de nada. O irmão tem trabalhado a fim de ganhar almas para Jesus, tem orado para que Deus dê força aos enfermos, para que eles possam suportar suas enfermidades, mas não orou para que Jesus os curasse; tampouco nos doutrinou acerca do batismo com o Espírito Santo, porque o senhor não crê nestas verdades. Porém, o irmão é testemunha ocular de alguns casos que acabei de citar.
Após ouvir as surpreendentes palavras do diácono e concluir que não encontraria ali o apoio de ninguém, o pastor Nilson dirigiu-se a Vingren e Daniel, e lhes disse:
- Já tomei a decisão que tinha de tomar. A partir deste momento, os senhores não podem mais ficar morando aqui. Procurem outro lugar; depois de tudo o que aconteceu, não os quero mais neste porão.
Em seguida, dirigiu-se ao pequeno grupo de crentes e perguntou:
- Quantos estão de acordo com essas falsas doutrinas?
Dezoito pessoas levantaram suas mãos, e foram avisadas de que seriam imediatamente excluídas de comunhão da igreja. Essa exclusão foi ilegalmente efetivada pelo seminarista Raimundo Nobre.
Vingren e Daniel Berg agradeceram ao pastor Erik todos os favores que este lhes havia prestado, e desejaram que em breve ele fosse também alcançado pela bênção do batismo com o Espírito Santo. Sem dizer palavra, o pastor virou-lhes as costas e retirou-se.
SURGE A IGREJA ASSEMBLEIA DE DEUS
Os dois missionários estavam agora sem ter para onde ir. Porém não se abalaram diante daquela situação. O Senhor Jesus, que os tinha dirigido até aquele momento, certamente continuaria com eles e os conduziria triunfalmente na gloriosa jornada que iniciavam.
Antes mesmo de Daniel e Vingren expressarem qualquer palavra com relação ao futuro que lhes aguardava, um irmão se adiantou e falou em nome dos demais.
- Irmão Vingren e irmão Daniel, compreendemos a vossa preocupação. Quero dizer, porém, que tenho à vossa disposição uma grande sala em minha casa, que pode ser utilizada para realização de cultos. Quanto ao problema da moradia, minha casa tem espaço suficiente para ambos.
Felizes diante da imediata providência de Deus, os missionários aceitaram o convite. Naquela mesma noite, na casa da irmã Celina de Albuquerque, na rua Siqueira Mendes, 67, no dia 18 de junho de 1911, sob a direção de Vingren e Daniel, foi realizado oficialmente o primeiro culto pentecostal no Brasil.
A igreja foi organizada com o nome de Missão de Fé Apostólica.
E assim, sob o límpido céu equatorial, como trigo semeado entre pedras e espinhos, alva e resplandecente como um lírio, começou a florescer nas cidades e nas selvas do Pará e do Amazonas, a igreja que, em 11 de janeiro de 1918, seria denominada Assembléia de Deus.
E nada, nada conseguiu deter seu avanço. Ataques, acusações e folhetos caluniosos só serviram para aumentar o número de pessoas que vinham assistir aos cultos pentecostais e ouvir Gunnar Vingren e Daniel Berg falarem acerca do batismo com o Espírito Santo e da cura divina, e sobretudo verem a manifestação do poder de Deus entre os irmãos.
COLPORTANDO AS SEMENTES DE VIDA ETERNA
Quando as Bíblias e os Novos Testamentos, pedidos por Daniel Berg, chegaram dos Estados Unidos, iniciou-se então em Belém o que podemos denominar de a primeira atividade de colportagem dos pentecostais. Para desenvolver a colportagem a contento, Daniel Berg deixou o emprego na fundição, e logo constatou que não era difícil vender sua preciosa mercadoria, pois, naquela época, Bíblias e Novos Testamentos em português eram raridade no Brasil.
Ele saía pela manhã com sua maleta de colportor, caminhando por ruas e estradas, batendo em dezenas de portas, oferecendo Bíblias e Novos Testamentos, e ao mesmo tempo convidando as pessoas a comparecerem ao culto, à noite.
Os frutos daquela semeadura começaram a surgir. Após crerem no Evangelho de liberdade e transformação, homens que negociavam com cigarros e bebidas alcoólicas queimavam essas mercadorias e passavam a negociar em outro ramo de comércio.
Ao crerem no poder de Jesus Cristo, enfermos eram alcançados pela cura divina.
Para intensificar suas atividades de evangelismo e colportagem, Daniel resolveu seguir ao longo da estrada de ferro Belém-Bragança, onde dezenas de cidades e vilas jamais haviam sido evangelizadas. Após despedir-se da igreja e de Gunnar Vingren, o qual estava desenvolvendo em Belém um considerável ministério como pregador, dirigente e fundador de trabalhos, Daniel Berg partiu, levando consigo duas malas cheias de Bíblias, e no coração a poderosa chama do Espírito Santo.
Partiu pouco antes do amanhecer, quando pelos caminhos ainda soprava a brisa suave da madrugada, e os pássaros saudavam docemente a pálida luz da aurora, que pouco a pouco inundava a vastidão do céu.
Sabedores de que a Palavra da Verdade caminharia junto com aquele homem destemido, e em breve resplandeceria em milhares de corações, os padres daquelas cidades e vilas ordenaram que ninguém conversasse nem acolhesse em suas casas um homem alto, forte, que carregava consigo duas malas contendo livros e insistia sempre em conversar com aqueles a quem se dirigia.
Daniel entendeu rapidamente a situação. Ao andar pelas ruas do primeiro lugarejo que encontrou no início de sua viagem, observou que todos o olhavam, curiosos e apreensivos.
Após caminhar por algumas horas, o missionário resolveu descansar sob uma frondosa árvore. Era quase meio-dia, e o calor se intensificara. Na limpidez do céu azul, o sol brilhava implacável. Sob aquela sombra acolhedora, Daniel pediu a Deus que interferisse poderosamente em seu favor, esmiuçando as muralhas da descrença e penetrando na dureza dos corações.
Fez uma ligeira refeição e esperou que a leve brisa da tarde começasse a soprar.
Deus o conduziu, da sombra daquela árvore a uma casa onde uma senhora idosa jazia sobre o leito, gravemente enferma. E ali, entre velas e algumas pessoas que rezavam ajoelhadas diante de uma imagem, Deus manifestou o seu poder através de Daniel Berg. Ajoelhado à cabeceira da cama daquela mulher que momentos antes havia sido desenganada pelo médico, o missionário começou a conversar com a enferma.
- A senhora tem fé em Deus e em seu Filho Jesus Cristo?
Ela não pronunciou nenhuma palavra, mas acenou afirmativamente com a cabeça.
- Afirmo-lhe que Jesus se encontra presente neste quarto e está pronto a curá-la - continuou Daniel. - A única coisa que a senhora tem a fazer é crer nele. Desprenda-se da contemplação desta imagem, afaste o seu pensamento dela e dirija-o a Jesus, agora. Foi para dar salvação e paz a todos, sobretudo a pessoas como a senhora, que Ele morreu na cruz. Creia nestas verdades, e será curada e liberta do pecado.
Todos os presentes estavam admirados, ouvindo atentamente as palavras que aquele estranho, ajoelhado ao lado da cama, dizia à enferma.
- Mas isto parece ser coisa muito simples! - respondeu a mulher. - Será possível chegar a Jesus tão facilmente?
- Sim, é absolutamente possível. Nós, os seres humanos, costumamos colocar obstáculos no caminho de Deus, e, consequentemente, impedimos que Ele faça a obra em nossa vida. Porém, se a senhora quiser, eu posso pedir a Ele que a cure e que escreva o seu nome no Livro da Vida.
A enferma aceitou. Daniel Berg então pediu que todos curvassem a cabeça reverentemente, e, orientando a enferma a acompanhá-lo em oração, ergueu sua voz aos céus. Após a oração, confessando estar sentindo um indizível refrigério em sua alma, a senhora adormeceu.
Ao sair daquela casa, o missionário deixou ali uma nova criatura em Jesus Cristo. Tempos depois, vários parentes daquela senhora se converteram ao Evangelho, e o seu lar foi transformado em um templo da Assembléia de Deus!
RESGATANDO ALMAS PARA JESUS
Muitas foram as experiências vividas por Daniel Berg durante sua longa caminhada margeando a estrada de ferro Belém-Bragança. Por ele ter sido perseverante, e acreditado que a chama pentecostal em breve irromperia em inúmeros pontos do Brasil, e por não se ter entristecido com as afrontas e agressões físicas, as sementes plantadas germinaram e floresceram.
E os frutos do seu labor perseverante estão sendo colhidos há quase 100 anos em todo o território brasileiro.
Evangelizando as cidades e os lugarejos que encontrava ao longo da Belém-Bragança, "o estrangeiro que vendia Bíblias" caminhava anunciando a Luz Eterna que redime vidas e transforma os corações. E era ouvindo a Palavra de Deus que muitos adversários do Evangelho se convertiam e saíam por sua vez, a levar a outros a mensagem de salvação.
Como fruto daquela dificultosa viagem, em pouco tempo vinte templos da Assembléias de Deus surgiram entre Belém e Bragança.
Apesar das barreiras erguidas por todos os lados; apesar das perseguições e das agressões físicas (certa vez jogaram lama no rosto de Daniel, quando ele estava pregando), a obra de Deus cresceu portentosamente, avivada pela chama do Espírito Santo.
De Bragança, Daniel partiu para levar o Evangelho aos moradores de centenas de casebres construídos em plena selva. Deixou ruas e estradas para trás, e passou a caminhar por veredas estreitas, por caminhos desconhecidos, por trilhas abertas na floresta tropical.
Ali, gigantescas árvores erguiam possantemente, formando, no alto, em todas as direções da selva, um teto de folhagem que só permitia, num e noutro lugar, a filtragem de alguns raios solares. Não existe sol do meio-dia nas florestas.
A fraca luminosidade sob as árvores dá a impressão de se estar sempre em pleno entardecer.
Conduzindo duas malas repletas de Novos Testamentos e Bíblias, Daniel caminhou pela selva à procura de almas para o reino de Deus. Logo aprendeu que os moradores daquela região costumavam construir suas casas nas proximidades de clareiras e nas margens dos rios.
No meio daquelas humildes casas de palha, certa vez ele se deparou com um grupo de crianças que brincavam. Depois de conquistar-lhes a confiança, Daniel ficou sabendo, através delas, que a mãe de um rapazinho ali presente havia morrido naquele dia.
Conduzido por esse rapaz, Daniel entrou naquela casa onde algumas pessoas choravam ao redor da morta. Leu um trecho da Bíblia sobre a ressurreição; orou; confortou o dono da casa e ganhou aquela família para Jesus.
Antes de se afastar daquela localidade, Daniel foi vítima de um atentado, mas o Senhor fez com que hso homens sanguinários o confundissem com um morador da região. Porém, apesar das perseguições e da neutralidade da autoridade policial local, uma pequena congregação da Assembleia de Deus surgiu ali.
Após certificar-se de que a igreja que por ele fora estabelecida estava firmada em Jesus Cristo e cheia do poder de Deus, Daniel despediu-se dos irmãos e partiu, seguindo a direção que o Espírito Santo lhe indicava. Para atingir o lugarejo mais próximo, era necessário alugar um barco e atravessar o rio Amazonas em um dos trechos onde ele é muito grato.
Na outra margem erguia-se a selva e seus inumeráveis perigos.
DANIEL BERG FRENTE A FRENTE COM UMA SUCURI
Conversando com o barqueiro que o conduzia à outra margem do rio, Daniel foi informado de que naquela região havia cobras gigantescas, onças pintadas e muitos jacarés. O missionário comentou com o barqueiro:
- Não conheço esta região, mas nada do que o senhor citou me causa medo, pois Jesus está comigo - e em seguida o Danial passou a fazer uma apresentação mais detalhada Jesus, seu melhor amigo.
No final daquela conversa, o barqueiro aceitou a Cristo como seu Salvador. Sentados diante um do outro, dentro do barco, Daniel leu um trecho da Bíblia e pediu que o Senhor resgatasse aquela alma do pecado e da ignorância.
Quando chegaram à outra margem, o dia começava a escurecer. Os sons característicos da selva saudaram Daneil Berg, que desembarcou rapidamente, pegou suas duas malas, rejeitou as armas que o barqueiro lhe ofereceu (ele argumentou que estava levando a mais possante de todas as armas - a Bíblia) despediu-se do barqueiro e rumou para o estreito caminho que se iniciava ali e se perdia no interior da selva.
Começou a andar apressadamente, pois em breve seria noite, e ele sabia que teria de atravessar um pântano. À medida que avançava, a vereda tornava-se mais estreita. Cipós cruzavam de uma árvore a outra, e havia galhso e torncos no chão, que lhe dificultavam os passos.
Mas Daniel Berg caminhava sob a luz do Altíssimo, e seu coração descansava na confiança depositada em Deus.
Alcançou o pântano, tirou os sapatos, arregaçou a bainha da calça e iniciou a dificultosa travessia, atolando-se aqui, caindo ali, até chegar ao outro lado. Lavou-se rapidamente, calçou os sapatos e continuou sua difícil caminhada pela floresta.
Os sapatos começaram a calejar-lhe os pés. Ele os tirou imediatamente. Foi picado pelas formigas, pisou em cactus, tentou livrar-se dos espinhos maiores, mas teve de continuar caminhando, pois a penumbra sob as árvores tornava-se cada vez mais densa, e havia os perigos noturnos da selva.
Sentia agulhadas finas e dores fortes nas plantas dos pés, mas não podia mais calçar os sapatos, pois os pés incharam. Subitamente estranhou que uma vala dividia o caminho. "Quem teria interesse em cavar uma vala no meio da selva?" pensou.
Mas parou imediatamente de caminhar ao lembrar-se do aviso dos irmãos e do barqueiro: "Quando encontrar uma vala na estrada, principalmente se for em terra mole, afaste-se dela, pois é o caminho da sucuri."
Ele ainda estava sob o efeito da lembrança dessas palavras, quando a gigantesca cobra apareceu à sua frente. A uma distância de menos de dois metros, a sucuri ergueu a cabeça até a altura do rosto de Daniel, e começou a fazer movimentos com o corpo, tentando hipnotizá-lo, como fazia com todas as suas vítimas, antes de atacá-las.
Paralisado pelo medo, o missionário começou a clamar angustiosamente em espírito, pedindo que o Senhor o livrasse daquele monstro pavoroso. O tempo parecia haver parado em toda a selva. Um suor frio descia lentamente da testa e ao longo da espinha dorsal de Daniel, e ele permanecia ali, parado diante da morte, clamando insistentemente a Deus.
Súbito, todo o corpo da sucuri estremeceu; como se tivesse visto algo que a amedrontara, a cobra desviou a cabeça para o lado, movimentou rapidamente seu enorme corpo desviando-se do seu caminho habitual, e sumiu velozmente por entre as árvores.
SALVO DE SER DEVORADO POR UMA ONÇA
Daniel glorificou o nome do Senhor por aquele grande livramento, e reiniciou sua viagem, sentindo a alma leve e o coração cheio de júbilo e de gratidão a Deus!
Quando conseguiu alcançar uma vereda um pouco mais larga, a noite já se apossara completamente da floresta, e a escuridão era total. Caminhando descalço, Daniel temia pisar em algum inseto venenoso ou ser picado por uma cobra.
De repente o urro de uma onça cortou o silêncio da noite. O missionário parou e esperou que a fera desse outro sinal. A onça urrou outra vez, em um lugar mais próximo dali. Subitamente começaram a ser ouvidos os latidos de um cão, mas logo transformaram-se em ganidos, e em seguida silenciaram.
Daniel continuou a caminhar, os olhos prescrutando a densa escuridão da selva, os ouvidos atentos aos ruídos noturnos, esperando a onça urrar a qualquer momento.
Inesperadamente, uma pequena luz movimentou-se por entre as árvores, e começou a se aproximar dele. Era uma lamparina de querosene. O homem que a conduzia olhou desconfiado para Daniel, mas logo recobrou a confiança ao ser cumprimentado pelo missionário.
Após trocarem algumas palavras, o homem ergueu a lamparina acima de sua cabeça e apontou para os restos sanguinolentos de um animal que jazia morto há alguns metros dali, e disse:
- Era o meu cachorro. Ele nunca enfrentou antes a onça diretamente. Semore a temeu. Mas hoje algo o levou a enfrentar a fera até a morte.
Imediatamente Daniel entendeu que Deus usara aquele cachorro para livrá-lo das garras assassinas da onça. Após convidar o missionário a hospedar-se em sua casa, o caboclo falou:
- O senhor deve ter uma arma bem possante, pois só estando bem armado alguém teria coragem de andar por esses lados, cheios de cobras e onças.
- Sim, realmente eu ando bem armado. A minha arma é esta - respondeu Daniel, mostrando-lhe a Bíblia.
Caminharam até chegar diante de uma casinha humilde, de paredes de barro e de varas (taipa), com teto de palha. Ali morava aquele homem com a esposa e filhos. Eles arranjaram água para o missionário lavar os pés, ajudaram-no a se livrar dos espinhos maiores (no outro dia, o ajudariam a tirar os menores), prepararam-lhe uma rápida refeição e providenciaram um lugar onde ele pudesse repousar aquela noite.
Naquela casa o Senhor mais uma vez livrou Daniel de ser picado por uma cobra. No dia seguinte, após presentear o caboclo com uma Bíblia, Daniel prosseguiu sua viagem, sabendo que deixara a semente do Evangelho plantada naqueles corações.
Daneil caminhou pela floresta até o anoitecer, quando parou para dormir em uma cabana sem teto. A chuva que caiu naquela madrugada deu-lhe a impressão de que a água arrastaria a cabana. Porém seu coração estava tranquilo, pois ele sabia que as Bíblias estavam bem protegidas dentro da mala.
Mas as roupas que usava só secaram algumas horas depois, quando ele reiniciou a viagem até chegar a um lugarejo, onde um pequeno grupo de irmãos o recebeu.
Naquele vilarejo, Daniel realizou cultos ouvindo urros de onças e gritos de outros animais bem próximo da casa onde os irmãos se reuniam. Segurando em uma das mãos a lamparina de querosene e empunhando a Bíblia com a outra, Daniel Berg lia a Palavra de Deus diante da pequena congregação. Por não dispor das mãos livres, os mosquitos picavam o seu rosto, pescoço e braços.
Foi em um desses cultos que ele contraiu malária. Debilitado e sentindo febre e calafrios por todo o corpo, o missionário ficou acamado durante vários dias. No intuito de reanimá-lo, os irmãos chegaram até a preparar-lhe um jantar especial, cujo prato principal era uma das iguarias da selva: um macaco cozido!
Agradecendo a gentileza dos irmãos, o missionário confessou estar sem apetite...
Alguns dias depois, Daniel foi reconduzido a Belém em companhia de dois irmãos (um deles fora enviado por Gunnar Vingren, que dias antes recebera uma carta de Daniel, onde este lhe falava do seu estado de saúde).
Os três viajantes atravessaram a selva, foram transportados pelo mesmo barqueiro que fizera a travessia de Daniel Berg, chegaram em terra firme e caminharam até a estrada de ferro onde Gunnar Vingren os esperava.
Daniel foi conduzido à casa de Vingren, e lá ficou, tendo crises de febre até que o Senhor o curou. (Alguns meses depois, o missionário tornou a contrair a doença, mas, então o Senhor o curou de uma vez por todas.)
OS CAÇADORES DE ESMERALDAS RESGATADAS PARA O TESOURO DO CÉU
Deus ainda usou inúmeras vezes o seu servo no meio dos perigos da selva, dos rios caudalosos e de homens sanguinários, até chamá-lo, em 1963, para as mansões eternas. Mas nem o naufrágio que sofreu, pela correnteza de um perigoso rio, ao navegar em uma pequena canoa, nem as dificuldades enfrentadas durante as viagens no barco Boas-Novas, nem as palavras e os gestos ameaçadores que lançaram sobre ele e Vingren, quando visitavam a ilha de Marajó, fizeram-nos desistir do empreendimento maravilhoso de levar a Palavra de Deus aos corações de muitos daqueles que viviam em pequenas cidades e entre rios e florestas daquelas regiões longínquas.
Na condição de evangelistas e primeiros colportores pentecostais no Brasil, Daniel Berg e Gunnar Vingren avançaram pelas cidades e pelas selvas adentro, alcançando casas isoladas e lugarejos de difícil acesso; caminharam centenas de quilômetros a pé, navegaram pelos rios do Amazonas e do Pará, sob o sol, sob a chuva, de noite e de dia, por veredas estreitas e mato fechado, enfrentando os mosquitos transmissores da malária, os perigos e as surpresas da floresta e do coração do homem mau, realizando um trabalho superior ao de Fernão Dias Paes Leme, o bandeirante caçador de esmeraldas, pois pescavam almas preciosas para o reino de Deus.
À semelhança do grande bandeirante, aqueles dois missionários também desbravaram o desconhecido, mas tão-somente à procura de almas, de "esmeraldas" resgatadas das impurezas do mundo para serem conduzidas ao Tesouro do Céu. E deles pode-se dizer o mesmo que Olavo Bilac disse de Fernão Leme:
"Cada passada sua era um caminho que surgia." Pelas veredas do Evangelho dificultosamente abertas, germinaram, como sementes férteis, as gotas de suor de Daneil Berg e Gunnar Vingren, suas lágrimas, a fome, as vigílias. E hoje, sob as mãos abençoadoras de Cristo, quando a Assembleia de Deus cresce em todo o Brasil e neste ano de 2011 comemorará o seu centenário, o Espírito Santo reascende continuamente nos corações de todos os pentecostais do Brasil, a esperança de, um dia, nas ruas da Jerusalém Celestial, podermos nos encontrar e abraçar os nossos irmãos Daniel Berg e Gunnar Vingren, que, para levarem a semente de vida eterna ao coração de milhares de brasileiros, enfrentaram corajosamente os imensos desafios das cidades e os grandes perigos das selvas amazônicas.
Jefferson Magno Costa
Ao se aproximar do Oceano Atlântico, o rio Amazonas divide-se à direita e à esquerda. Nesse trecho alarga-se muito e recebe, à direita, o nome de rio Pará, formando o amplo espaço aquático da baía de Marajó, desaguando em seguida no oceano.
Para alcançar Belém, capital do Estado do Pará, os navios vindos do Atlântico penetram a baía e navegam as águas em sentido contrário ao curso do rio, aproximando-se do porto da cidade pela margem esquerda.
No dia 19 de novembro de 1910, dezenas de pessoas acompanhavam as manobras de navegação de um grande navio que se aproximava do Cais de Belém. A realização de várias atividades portuárias naquela manhã não permitiu que o navio Clement atracasse no cais.
Por esse motivo, um barco foi enviado para transportar os passageiros do navio que chegara de Nova Iorque e acabara de lançar âncora ao largo do porto.
Quando o barco proximou-se do cais trazendo os passageiros, um grupo de homens, mulheres e crianças começou a acenar, a sorrir, a gritar, a bater palmas, a pronunciar nomes, numa efusão de alegria autenticamente brasileira.
Ao desembarcarem, os passageiros viram-se rodeados pelos parentes e amigos, que, entre palavras, sorrisos e abraços, ajudavam-nos a levar a bagagem.
Quando quase todos já haviam desembarcado, dois homens, empunhando firmemente as alças de suas malas, pisaram solenemente na plataforma do cais. Não havia ninguém à espera deles. Porém, o desembarque desses dois estrangeiros em solo brasileiro, numa clara manhã de novembro, terá em breve um grandioso significado para a história do Movimento Pentecostal no Brasil.
Nesse momento, os pés desses dois homens estão a pisar firmemente o solo de um país que eles ainda desconhecem, mas em breve aqueles pés tornar-se-ão cansados e feridos, porém formosos sobre os montes, pedras, selvas, espinhos e cidades brasileiras, quando os dois missionários saírem a anunciar as Boas-novas de salvação.
Aqueles dois homens ainda não são capazes de pronunciar nenhuma palavra da língua portuguesa, mas são capazes de falar em mistérios com Deus. Ambos não refletem em seus semblantes a alegria que se vê estampada nos rostos amorenados dos homens, mulheres e crianças que falam alto, se abraçam e se afastam do cais, mas nos corações daqueles dois estrangeiros arde a chama do Espírito Santo, um fogo suficiente para produzir cânticos e júbilos tão intensos, que em breve irromperão nos lábios e nos corações das primeiras almas resgatadas das trevas para fazerem parte do grande rebanho da Assembleia de Deus no Brasil.
Nascidos na Suécia, eles embarcaram em Nova Iorque naquele navio desconfortável que acabara de chegar a Belém. Além da grande fé que trazem nos corações, e da pouca bagagem, eles dispõem de uma quantia tão pequena de dinheiro, que não lhes permite aceitar que os carregadores transportem suas malas.
Um deles é forte, a pele clara, os cabelos e bigodes escuros, o olhar sereno e decidido. O outro é loiro, alto, de olhos azuis, com as pontas do bigode dobradas para cima, a olhar com firmeza e curiosidade para todas as coisas. O de cabelos escuros chama-se Daniel Berg. O outro, Gunnar Vingren. Ambos foram enviados por Deus para trazer o Pentecoste ao Brasil.
Quando ainda estavam em Nova Iorque, Daniel e Vingren haviam decidido comprar passagens de terceira classe, a fim de economizarem o pouco dinheiro de que dispunham.
Consequentemente, quase não puderam se alimentar durante a viagem, pois a comida que serviam aos passageiros dessa classe era de má qualidade. Por esse motivo, ao se distanciarem do cais, a primeira resolução que tomaram foi localizar um restaurante, quando então, e pela primeira vez após muitos dias de viagem, puderam servir-se de uma refeição digna, e entrar em contato com o cardápio brasileiro.
Após saírem do restaurante, Vingren perguntou a Daniel:
- E agora Daniel, para onde vamos?
- Vamos subir por esta rua, Vingren, e certamente Deus nos orientará sobre o que devemos fazer.
A CIDADE ETERNA
Carregando suas malas, os dois embaixadores do Deus Altíssimo começaram a subir lentamente a rua. Tudo o que viam ali era infinitamente diferente do que tinham visto nos Estados Unidos e na Suécia. As torres altas das belas casas em estilo colonial contrastavam com os casebres extremamente pobres que circundavam a cidade.
Ruas pedregosas e poeirentas se ramificavam em várias direções perpendiculares ao rio. Transitando normalmente por essas ruas, vários leprosos, que haviam acorrido à Belém ao ouvirem dizer que naquela cidade fora descoberta a cura da lepra, expunham ao olhar dos transeuntes os seus corpos mutilados pela doença. Ao contemplarem esse quadro doloroso, um sentimento de compaixão e de amor invadiu os corações dos missionários.
Enquanto caminhavam observando a paisagem que se estendia adiante dos seus olhos, é provável que Daniel Berg e Gunnar Vingren tenha-se lembrado de suas cidades natal. Certamente, pouca coisa havia de comum entre aquelas duas cidades da Suécia e a cidade de Belém.
Porém, ao contemplarem aquelas ruas e aqueles homens e mulheres curiosos, muitos deles pobremente vestidos, a andarem para lá e para cá como ovelhas desgarradas que não têm pastor, os missionários devem ter-se lembrado dos montes, das fontes abundantes e dos lagos cristalinos existentes nas cidades onde nasceram, cidades montanhosas, lugares prediletos dos reis da Suécia para a realização de caçadas.
E certamente naquela hora desejaram falar àquele povo da existência de um lugar muito diferente de Belém, e mais belo e infinitamente mais vasto do que toda a Suécia. Um lugar onde não há ruas pedregosas e acidentadas, nem casas mal iluminadas e pobres, ou pessoas sem mãos, sem orelhas, sem nariz e sem dedos a andar sem rumo.
Eles lhes falariam da Jerusalém Celestial, a pátria eterna de todos os que aceitam a Jesus como Salvador, e guardam sua Palavra no coração. A Cidade das Doze Portas, em cujas ruas de ouro e cristal, em tempo sempre sereno e claríssimo, brilha o Sol da Justiça. Anunciariam a existência das amplíssimas regiões celestiais, onde, quando se iniciar o jubileu das eternas bem-aventuranças, os salvos e remidos pelo sangue do Cordeiro viverão eternamente contemplando a Face adorada de Jesus.
O PRIMEIRO INDÍCIO DA EXISTÊNCIA DE UM EVANGÉLICO EM BELÉM
Após andarem durante algum tempo, os missionários resolveram sentar-se em um banco de jardim, e ali fizeram uma oração, pedindo a Deus que os fizesse encontrar um evangélico.
Ao concluírem a oração, sentiram desejo de voltar na direção do porto. Uma família que também viajara no navio Clement, e falava inglês, os encontrou e lhes indicou um hotel. Ali os missionários entraram em contato com outra pessoa que também falava inglês, e esta informou que conhecia um evangélico naquela cidade, mas não sabia onde morava.
Já era noite. Os missionários trataram então de arranjar um quarto naquele hotel. Ao fazerem um balanço de suas finanças, descobriram que só dispunham de quatro dólares e alguns cêntimos. Não ficaram nada surpresos ao saber que um quarto para duas pessoas custava 16 mil réis (o equivalente, na época, a quatro dólares).
Com o restante pagariam a passagem de bonde no dia seguinte.
Ao se recolherem para dormir, Vingren deparou-se com um jornal jogado no chão. Certamente o hóspede anterior o esquecera ali.
Apesar de não entender nada da língua portuguesa, o missionário passou a folheá-lo assim mesmo. Súbito, gritou para Daniel:
- Aqui está, Daniel, a resposta de Deus! O redator deste jornal é o irmão Justus Nelson, um pastor metodista que eu conheci na América do Norte. Amanhã nós iremos procurá-lo, e ele certamente nos dará as orientações de que necessitamos.
Aquela noite Daniel Berg e Gunnar Vingren elevaram suas vozes em oração ao Onipotente e misericordioso Deus, e agradeceram-lhe o cuidado e o amor que Ele estava tendo com suas vidas, e a direção e a paz que enchia os seus corações. Confiantes em Jesus, o sublime e seguro guia de suas almas, adormeceram.
HOSPEDADOS NO PORÃO DA CASA DO PASTOR BATISTA
No dia seguinte, após pedirem que Deus os conduzisse, tomaram o café da manhã e saíram à procura do pastor metodista. Ao chegarem à casa do irmão Justus Nelson, este os recebeu alegremente. Após contar-lhes as muitas experiências que vivera ali, o irmão Nelson tratou de conduzir os missionários ao pastor batista local, irmão Erik Nilson, também de origem sueca.
Erik Nilson recebeu alegremente os seus compatriotas e irmãos na fé. Quando soube que estavam hospedados em hotel, convidou-os a morar no porão da igreja, e a auxiliá-lo nos trabalhos da Igreja Batista, em Belém, situada na Rua João Balby, no. 406.
Daniel e Vingren aceitaram o convite. Voltaram para apanhar a pouca bagagem que lhes pertencia, e passaram a morar em um corredor escuro e abafado.
A notícia de que dois missionários haviam recentemente chegado dos Estados Unidos alcançou rapidamente as quatro igrejas evangélicas existentes em Belém. E logo Daniel e Vingren passaram a visitar essas igrejas, pois todos os irmãos queriam vê-los e ouvi-los.
Em uma dessas igrejas, os missionários cantaram em duas vozes o hino Jesus Christ is made to me, all I need, all I need (Jesus Cristo é tudo para mim, tudo o que eu necessito, tudo o que eu necessito), e o poder de Deus caiu maravilhosamente sobre os irmãos!
Já em suas primeiras pregações, Daniel e Vingren passaram a falar acerca do batismo no Espírito Santo. Este assunto era novidade para quase todos os crentes batistas, e para os das outras denominações também. Porém, alguns deles já tinham ouvido ou lido anteriormente acerca do assunto, mas não sabiam que a promessa do batismo com o Espírito Santo era também para eles. Após a chegada dos missionários, o número de ouvintes da Palavra de Deus aumentou rapidamente.
Antes, nem os cultos aos domingos conseguiam encher a metade do templo. Quando Vingren e Daniel Berg passaram a tomar parte ativa nos trabalhos, o templo da igreja Batista encheu de tal maneira que muita gente teve de assistir aos cultos em pé.
CONHECENDO OS SEGREDOS DA SELVA
Um mês após haverem chegado ao Pará, os missionários foram convidados pelo irmão Adriano Nobre, que era membro da Igreja Presbiteriana em Belém, para uma viagem à casa dos seus pais. Os pais de Adriano moravam em uma localidade chamada Boca do Ipixuna. Ali os seringueiros extraíam a borracha.
Durante três dias seguidos, Vingren e Daniel viajaram de barco por diversos rios. Foi então que puderam entrar em contato com aquela selva imensa, com árvores que pendiam seus frondosos galhos para dentro dos rios; com belíssimas orquídeas e grandes cipós arqueados como arcos de triunfo, a saudar o avanço dos dois servos de Deus pelos mistérios da selva!
Árvores arrancadas pelas águas desciam lentamente na correnteza. Derivando-se dos rios maiores, dezenas de afluentes abriam-se em leque, serpenteando por entre a floresta, formando ilhas, alagadiços e igapós. Abrindo o vôo, bandos de pássaros cortavam o límpido e sereno céu sobre as selvas.
No alto das árvores, subitamente, macacos pulavam com agilidade de um galho para outro. Havia crocodilos nas margens dos rios, borboletas coloridas que, aqui e ali, voavam no ar onde se respirava o perfume agreste das flores tropicais.
Mas também havia as pragas. O carapanã (mosquito) atacava ao anoitecer e só dava tréguas pela manhã, quando era substituído pela mutuca (espécie de mosca sanguessuga).
Curiosos e maravilhados diante do mundo de beleza e mistério que se estendia diante dos seus olhos, os missionários ouviam, durante o dia, cantos, silvos, urros e estalidos que contrastavam com o silêncio que, à noite, caía sobre os animais adormecidos e ocultos entre as gigantescas árvores.
Viajando por rios estreitos e largos, os missionários puderam contemplar a beleza daquelas noites sossegadas, noites em que, no plenilúnio, o majestoso luar se apossa do escuro azul do céu, e as estrelas brilham à flor dos rios como um bando de aves de prata.
Quando se aproximaram da localidade onde moravam os pais de Adriano Nobre, Vingren e Daniel viram, às margens dos rios, casas erguidas sobre pilares de madeira - as palafitas. Ficaram felizes ao saber que no interior de algumas delas moravam famílias evangélicas.
Ali participaram de pequenas reuniões de oração, onde puderam pregar a Palavra de Deus e cantar em português alguns hinos decorados. Os missionários comeram do que havia de melhor no interior daqueles humildes lares: farinha, arroz, feijão sem sal, carne seca e café sem leite. No final de um mês e meio, retornaram a Belém.
A PRIMEIRA PESSOA NO BRASIL BATIZADA COM O ESPÍRITO SANTO
Para obterem dinheiro e poderem pagar um professor de português, ficou combinado que Daniel voltaria a exercer o ofício de fundidor que aprendera nos Estados Unidos, enquanto Vingren estudaria durante o dia. À noite, Vingren ensinaria a Daniel o que aprendera.
E assim, com muito esforço, aprenderam o português. O salário de 12 mil réis por dia proporcionou aos missionários condições de se manterem relativamente bem e poderem comprar Bíblias e Novos Testamentos nos Estados Unidos.
Os irmãos passaram a visitar a moradia de Vingren e Berg, e no decorrer do tempo, comprovaram que eles eram homens de oração e de fé, e viviam o que pregavam. Nessa ocasião, os missionários ficaram sabendo que muito antes de sua chegada a Belém, os diáconos da igreja Batista estavam orando todos os sábados, pedindo a Deus que enviasse mais missionários ao Brasil.
Portanto, Daniel e Vingren eram considerados por esses irmãos como resposta às suas orações. Além do mais, o fato de os dois missio¬nários viverem naquele porão em condições tão precárias e continuarem sadios e dispostos a pregar a Palavra de Deus a qualquer hora do dia ou da noite, era uma indiscutível prova de que Deus os enviara.
Os irmãos que se reuniam na moradia dos missionários passaram a receber com mais assiduidade ensinamentos acerca do batismo com o Espírito Santo e da cura divina. No quartinho existente naquele porão, e nos lares de alguns crentes da Igreja Batista, vários cultos passaram a ser realizados.
Num desses cultos, Gunnar Vingren perguntou a uma irmã que sofria de câncer nos lábios, se ela estava disposta a abandonar todos os remédios que usava e crer que Jesus a podia curar naquele momento. Ela respondeu que sim. Os irmãos oraram e o Senhor a curou imediatamente!
Aquela irmã chamava-se Celina de Albuquerque, e nos cultos de adoração que se seguiram, ela começou a pedir a Jesus o batismo com o Espírito Santo.
Naquela mesma semana, após o culto de quinta-feira, acompanhada da irmã Nazaré, ela continuou buscando a face do Senhor, e à uma hora da madrugada, Jesus a batizou com o Espírito Santo e com fogo, e ela falou durante mais de duas horas em outras línguas com Deus! Segundo o que documentou Gunnar Vingren, "foi a primeira operação do batismo com o Espírito Santo feita pelo Senhor Jesus Cristo em terras brasileiras".
No outro dia, a irmã Nazaré, que vira a irmã Celina ser batizada, relatou aos demais membros da igreja tudo o que testemunhara.
Naquele mesmo dia, orando em companhia de outras irmãs no local onde os missionários realizavam cultos de oração, a irmã Nazaré também foi batizada com o Espírito Santo, e cantou um hino no Espírito!
Com exceção de um evangelista e da esposa de um diácono, todos os demais irmãos que testemunharam a manifestação do poder de Deus na vida daquelas duas irmãs, creram que tudo aquilo era obra do Espírito Santo.
A VISITA DO PASTOR BATISTA E SUAS CONSEQUENCIAS
Certa noite, quando vários irmãos reunidos no porão onde moravam os missionários, oravam e cantavam hinos de louvor a Deus, o pastor Erick Nilson, para surpresa de todos, ali apareceu. Gunnar Vingren e Daniel Berg já sabiam que ele não apoiava a doutrina do batismo com o Espírito Santo.
Nem ele nem Raimundo Nobre, que estava estudando para evangelista. Sabiam também que o pastor Nilson, logo que chegara ao Brasil, começara a pedir que Deus cumprisse nele essa promessa.
Depois de catorze dias buscando o batismo, suplicando em todas as horas disponíveis do dia e da noite que o Senhor o revestisse de poder, finalmente Deus começou a derramar poder sobre ele, porém sua esposa, amedrontada, pediu-lhe que parasse com ''aquilo", e não permitiu que ele recebesse a grandiosa promessa. A partir de então, Nilson tornou-se inimigo da doutrina pentecostal.
Quando o pastor entrou no recinto, os irmãos se levantaram para saudá-lo. Fez-se total silêncio no porão. Os missionários convidaram-no a participar do culto improvisado, mas ele recusou. Diante da surpresa e do ligeiro temor de alguns irmãos, o pastor identificou com o olhar a cada um dos crentes ali presentes, e disse:
- Vejo que chegou a hora de tomar uma decisão. Há algum tempo venho observando discussões acerca de certas doutrinas que não admito como certas. Isto nunca aconteceu desde que comecei a pastorear a igreja aqui em Belém. Sei, contudo, que os responsáveis por essa situação são os irmãos Gunnar Vingren e Daniel Berg, que, possuídos de um sentimento separatista, têm semeado dúvidas e inquietação no seio da igreja.
- Irmão Erik Nilson - respondeu imediatamente Gunnar Vingren - Deus é testemunha de que não estamos aqui possuídos de nenhum sentimento separatista, e nem desejamos a desunião dos irmãos. Pelo contrário, queremos que todos sirvamos a Deus unidos no mesmo Espírito. Porém, queremos aproveitar também este momento para tornar a afirmar que, se todos alcançarmos a experiência do batismo com o Espírito Santo, jamais nos dividiremos; seremos mais do que irmãos, seremos uma só família.
- Sei que a Bíblia fala acerca do batismo com o Espírito Santo e da cura divina - respondeu o pastor Nilson, já alterando o timbre da voz. - Porém, essas coisas foram para aquele tempo. Seria um absurdo que pessoas bem informadas viessem a acreditar que isso possa acontecer em nossos dias. Hoje, temos que ser realistas e procurar não nos envolver com sonhos e falsas profecias. Quanto aos senhores missionários, se não vos corrigirdes e reconhecerdes que estais errados, é meu dever comunicar a todas as igrejas Batistas o que está acontecendo, para que se previnam contra as vossas falsas doutrinas.
Gunnar Vingren e Daniel Berg ouviram tudo aquilo com a serenidade que os caracterizava. Após todos ficarem em silêncio por alguns instantes, Vingren tornou a falar. Afirmou lamentar muito que assuntos de tal importância estivessem motivando uma discussão de caráter pessoal. Falou também que todos ali eram servos de Deus, e pregavam acerca do mesmo Deus. E finalmente, concluiu:
- Na minha opinião, somos colegas, e não concorrentes. Saber quem leva as almas a Deus é coisa secundária. O que importa é que o número de almas salvas aumente cada vez mais. Não direi que o irmão não esteja na verdade, mas afirmo que não achou toda a verdade. Nós pregamos a verdade do batismo com o Espírito Santo e da cura divina, que Jesus pode realizar ainda em nossos dias.
Após ouvir o que Vingren dissera, o pastor Erik Nilson encarou os presentes. Todos os irmãos permaneciam em silêncio absoluto. Fitando os rostos impassíveis e serenos, o pastor olhou firmemente para um diácono - um dos mais antigos membros da Igreja Batista em Belém - e esperou encontrar nele o apoio que até então não encontrara em nenhum dos irmãos presentes. Mas foi para surpresa do pastor Nilson que esse irmão, em nome dos demais, disse:
- Agora somos pentecostais!
Pedindo inicialmente que o pastor Nilson não os considerasse traidores do Evangelho, o diácono afirmou que os irmãos reunidos ali jamais tinham tido tanta fé. A explicação para aquela mudança era que eles haviam encontrado a fé e o poder do Espírito Santo!
- Não temos queixa, pastor - falou o diácono - de antes o irmão não nos haver falado acerca destas verdades, pois o senhor as desconhece e, não as conhecendo, não nos poderia ensiná-las. Porém desejaríamos que o irmão também recebesse estas bênçãos de Deus, a fim de nos entendermos melhor, e podermos sentir a mesma comunhão uns com os outros.
Todos os irmãos aqui presentes encontram-se em um plano mais elevado, e mais perto do Céu. O irmão disse que é realista; pois bem, vou citar agora alguns casos reais ocorridos entre nós, algumas provas concretas do poder de Deus em nosso meio.
O diácono passou a relatar vários casos de cura ocorridos entre os irmãos. Certa irmã, que andava amparada por duas muletas, ouvia a pregação dos missionários acerca da cura divina, e, orando com fé, fora completamente curada!
A irmã ainda usava as muletas, mas dependuradas na parede de sua casa, em local bem visível, para que todos vissem de que modo maravilhoso Jesus a curara! O caso da irmã Celina também foi citado, juntamente com outros.
- Caro pastor, - concluiu o diácono - não queremos nem podemos acusá-lo de nada. O irmão tem trabalhado a fim de ganhar almas para Jesus, tem orado para que Deus dê força aos enfermos, para que eles possam suportar suas enfermidades, mas não orou para que Jesus os curasse; tampouco nos doutrinou acerca do batismo com o Espírito Santo, porque o senhor não crê nestas verdades. Porém, o irmão é testemunha ocular de alguns casos que acabei de citar.
Após ouvir as surpreendentes palavras do diácono e concluir que não encontraria ali o apoio de ninguém, o pastor Nilson dirigiu-se a Vingren e Daniel, e lhes disse:
- Já tomei a decisão que tinha de tomar. A partir deste momento, os senhores não podem mais ficar morando aqui. Procurem outro lugar; depois de tudo o que aconteceu, não os quero mais neste porão.
Em seguida, dirigiu-se ao pequeno grupo de crentes e perguntou:
- Quantos estão de acordo com essas falsas doutrinas?
Dezoito pessoas levantaram suas mãos, e foram avisadas de que seriam imediatamente excluídas de comunhão da igreja. Essa exclusão foi ilegalmente efetivada pelo seminarista Raimundo Nobre.
Vingren e Daniel Berg agradeceram ao pastor Erik todos os favores que este lhes havia prestado, e desejaram que em breve ele fosse também alcançado pela bênção do batismo com o Espírito Santo. Sem dizer palavra, o pastor virou-lhes as costas e retirou-se.
SURGE A IGREJA ASSEMBLEIA DE DEUS
Os dois missionários estavam agora sem ter para onde ir. Porém não se abalaram diante daquela situação. O Senhor Jesus, que os tinha dirigido até aquele momento, certamente continuaria com eles e os conduziria triunfalmente na gloriosa jornada que iniciavam.
Antes mesmo de Daniel e Vingren expressarem qualquer palavra com relação ao futuro que lhes aguardava, um irmão se adiantou e falou em nome dos demais.
- Irmão Vingren e irmão Daniel, compreendemos a vossa preocupação. Quero dizer, porém, que tenho à vossa disposição uma grande sala em minha casa, que pode ser utilizada para realização de cultos. Quanto ao problema da moradia, minha casa tem espaço suficiente para ambos.
Felizes diante da imediata providência de Deus, os missionários aceitaram o convite. Naquela mesma noite, na casa da irmã Celina de Albuquerque, na rua Siqueira Mendes, 67, no dia 18 de junho de 1911, sob a direção de Vingren e Daniel, foi realizado oficialmente o primeiro culto pentecostal no Brasil.
A igreja foi organizada com o nome de Missão de Fé Apostólica.
E assim, sob o límpido céu equatorial, como trigo semeado entre pedras e espinhos, alva e resplandecente como um lírio, começou a florescer nas cidades e nas selvas do Pará e do Amazonas, a igreja que, em 11 de janeiro de 1918, seria denominada Assembléia de Deus.
E nada, nada conseguiu deter seu avanço. Ataques, acusações e folhetos caluniosos só serviram para aumentar o número de pessoas que vinham assistir aos cultos pentecostais e ouvir Gunnar Vingren e Daniel Berg falarem acerca do batismo com o Espírito Santo e da cura divina, e sobretudo verem a manifestação do poder de Deus entre os irmãos.
COLPORTANDO AS SEMENTES DE VIDA ETERNA
Quando as Bíblias e os Novos Testamentos, pedidos por Daniel Berg, chegaram dos Estados Unidos, iniciou-se então em Belém o que podemos denominar de a primeira atividade de colportagem dos pentecostais. Para desenvolver a colportagem a contento, Daniel Berg deixou o emprego na fundição, e logo constatou que não era difícil vender sua preciosa mercadoria, pois, naquela época, Bíblias e Novos Testamentos em português eram raridade no Brasil.
Ele saía pela manhã com sua maleta de colportor, caminhando por ruas e estradas, batendo em dezenas de portas, oferecendo Bíblias e Novos Testamentos, e ao mesmo tempo convidando as pessoas a comparecerem ao culto, à noite.
Os frutos daquela semeadura começaram a surgir. Após crerem no Evangelho de liberdade e transformação, homens que negociavam com cigarros e bebidas alcoólicas queimavam essas mercadorias e passavam a negociar em outro ramo de comércio.
Ao crerem no poder de Jesus Cristo, enfermos eram alcançados pela cura divina.
Para intensificar suas atividades de evangelismo e colportagem, Daniel resolveu seguir ao longo da estrada de ferro Belém-Bragança, onde dezenas de cidades e vilas jamais haviam sido evangelizadas. Após despedir-se da igreja e de Gunnar Vingren, o qual estava desenvolvendo em Belém um considerável ministério como pregador, dirigente e fundador de trabalhos, Daniel Berg partiu, levando consigo duas malas cheias de Bíblias, e no coração a poderosa chama do Espírito Santo.
Partiu pouco antes do amanhecer, quando pelos caminhos ainda soprava a brisa suave da madrugada, e os pássaros saudavam docemente a pálida luz da aurora, que pouco a pouco inundava a vastidão do céu.
Sabedores de que a Palavra da Verdade caminharia junto com aquele homem destemido, e em breve resplandeceria em milhares de corações, os padres daquelas cidades e vilas ordenaram que ninguém conversasse nem acolhesse em suas casas um homem alto, forte, que carregava consigo duas malas contendo livros e insistia sempre em conversar com aqueles a quem se dirigia.
Daniel entendeu rapidamente a situação. Ao andar pelas ruas do primeiro lugarejo que encontrou no início de sua viagem, observou que todos o olhavam, curiosos e apreensivos.
Após caminhar por algumas horas, o missionário resolveu descansar sob uma frondosa árvore. Era quase meio-dia, e o calor se intensificara. Na limpidez do céu azul, o sol brilhava implacável. Sob aquela sombra acolhedora, Daniel pediu a Deus que interferisse poderosamente em seu favor, esmiuçando as muralhas da descrença e penetrando na dureza dos corações.
Fez uma ligeira refeição e esperou que a leve brisa da tarde começasse a soprar.
Deus o conduziu, da sombra daquela árvore a uma casa onde uma senhora idosa jazia sobre o leito, gravemente enferma. E ali, entre velas e algumas pessoas que rezavam ajoelhadas diante de uma imagem, Deus manifestou o seu poder através de Daniel Berg. Ajoelhado à cabeceira da cama daquela mulher que momentos antes havia sido desenganada pelo médico, o missionário começou a conversar com a enferma.
- A senhora tem fé em Deus e em seu Filho Jesus Cristo?
Ela não pronunciou nenhuma palavra, mas acenou afirmativamente com a cabeça.
- Afirmo-lhe que Jesus se encontra presente neste quarto e está pronto a curá-la - continuou Daniel. - A única coisa que a senhora tem a fazer é crer nele. Desprenda-se da contemplação desta imagem, afaste o seu pensamento dela e dirija-o a Jesus, agora. Foi para dar salvação e paz a todos, sobretudo a pessoas como a senhora, que Ele morreu na cruz. Creia nestas verdades, e será curada e liberta do pecado.
Todos os presentes estavam admirados, ouvindo atentamente as palavras que aquele estranho, ajoelhado ao lado da cama, dizia à enferma.
- Mas isto parece ser coisa muito simples! - respondeu a mulher. - Será possível chegar a Jesus tão facilmente?
- Sim, é absolutamente possível. Nós, os seres humanos, costumamos colocar obstáculos no caminho de Deus, e, consequentemente, impedimos que Ele faça a obra em nossa vida. Porém, se a senhora quiser, eu posso pedir a Ele que a cure e que escreva o seu nome no Livro da Vida.
A enferma aceitou. Daniel Berg então pediu que todos curvassem a cabeça reverentemente, e, orientando a enferma a acompanhá-lo em oração, ergueu sua voz aos céus. Após a oração, confessando estar sentindo um indizível refrigério em sua alma, a senhora adormeceu.
Ao sair daquela casa, o missionário deixou ali uma nova criatura em Jesus Cristo. Tempos depois, vários parentes daquela senhora se converteram ao Evangelho, e o seu lar foi transformado em um templo da Assembléia de Deus!
RESGATANDO ALMAS PARA JESUS
Muitas foram as experiências vividas por Daniel Berg durante sua longa caminhada margeando a estrada de ferro Belém-Bragança. Por ele ter sido perseverante, e acreditado que a chama pentecostal em breve irromperia em inúmeros pontos do Brasil, e por não se ter entristecido com as afrontas e agressões físicas, as sementes plantadas germinaram e floresceram.
E os frutos do seu labor perseverante estão sendo colhidos há quase 100 anos em todo o território brasileiro.
Evangelizando as cidades e os lugarejos que encontrava ao longo da Belém-Bragança, "o estrangeiro que vendia Bíblias" caminhava anunciando a Luz Eterna que redime vidas e transforma os corações. E era ouvindo a Palavra de Deus que muitos adversários do Evangelho se convertiam e saíam por sua vez, a levar a outros a mensagem de salvação.
Como fruto daquela dificultosa viagem, em pouco tempo vinte templos da Assembléias de Deus surgiram entre Belém e Bragança.
Apesar das barreiras erguidas por todos os lados; apesar das perseguições e das agressões físicas (certa vez jogaram lama no rosto de Daniel, quando ele estava pregando), a obra de Deus cresceu portentosamente, avivada pela chama do Espírito Santo.
De Bragança, Daniel partiu para levar o Evangelho aos moradores de centenas de casebres construídos em plena selva. Deixou ruas e estradas para trás, e passou a caminhar por veredas estreitas, por caminhos desconhecidos, por trilhas abertas na floresta tropical.
Ali, gigantescas árvores erguiam possantemente, formando, no alto, em todas as direções da selva, um teto de folhagem que só permitia, num e noutro lugar, a filtragem de alguns raios solares. Não existe sol do meio-dia nas florestas.
A fraca luminosidade sob as árvores dá a impressão de se estar sempre em pleno entardecer.
Conduzindo duas malas repletas de Novos Testamentos e Bíblias, Daniel caminhou pela selva à procura de almas para o reino de Deus. Logo aprendeu que os moradores daquela região costumavam construir suas casas nas proximidades de clareiras e nas margens dos rios.
No meio daquelas humildes casas de palha, certa vez ele se deparou com um grupo de crianças que brincavam. Depois de conquistar-lhes a confiança, Daniel ficou sabendo, através delas, que a mãe de um rapazinho ali presente havia morrido naquele dia.
Conduzido por esse rapaz, Daniel entrou naquela casa onde algumas pessoas choravam ao redor da morta. Leu um trecho da Bíblia sobre a ressurreição; orou; confortou o dono da casa e ganhou aquela família para Jesus.
Antes de se afastar daquela localidade, Daniel foi vítima de um atentado, mas o Senhor fez com que hso homens sanguinários o confundissem com um morador da região. Porém, apesar das perseguições e da neutralidade da autoridade policial local, uma pequena congregação da Assembleia de Deus surgiu ali.
Após certificar-se de que a igreja que por ele fora estabelecida estava firmada em Jesus Cristo e cheia do poder de Deus, Daniel despediu-se dos irmãos e partiu, seguindo a direção que o Espírito Santo lhe indicava. Para atingir o lugarejo mais próximo, era necessário alugar um barco e atravessar o rio Amazonas em um dos trechos onde ele é muito grato.
Na outra margem erguia-se a selva e seus inumeráveis perigos.
DANIEL BERG FRENTE A FRENTE COM UMA SUCURI
Conversando com o barqueiro que o conduzia à outra margem do rio, Daniel foi informado de que naquela região havia cobras gigantescas, onças pintadas e muitos jacarés. O missionário comentou com o barqueiro:
- Não conheço esta região, mas nada do que o senhor citou me causa medo, pois Jesus está comigo - e em seguida o Danial passou a fazer uma apresentação mais detalhada Jesus, seu melhor amigo.
No final daquela conversa, o barqueiro aceitou a Cristo como seu Salvador. Sentados diante um do outro, dentro do barco, Daniel leu um trecho da Bíblia e pediu que o Senhor resgatasse aquela alma do pecado e da ignorância.
Quando chegaram à outra margem, o dia começava a escurecer. Os sons característicos da selva saudaram Daneil Berg, que desembarcou rapidamente, pegou suas duas malas, rejeitou as armas que o barqueiro lhe ofereceu (ele argumentou que estava levando a mais possante de todas as armas - a Bíblia) despediu-se do barqueiro e rumou para o estreito caminho que se iniciava ali e se perdia no interior da selva.
Começou a andar apressadamente, pois em breve seria noite, e ele sabia que teria de atravessar um pântano. À medida que avançava, a vereda tornava-se mais estreita. Cipós cruzavam de uma árvore a outra, e havia galhso e torncos no chão, que lhe dificultavam os passos.
Mas Daniel Berg caminhava sob a luz do Altíssimo, e seu coração descansava na confiança depositada em Deus.
Alcançou o pântano, tirou os sapatos, arregaçou a bainha da calça e iniciou a dificultosa travessia, atolando-se aqui, caindo ali, até chegar ao outro lado. Lavou-se rapidamente, calçou os sapatos e continuou sua difícil caminhada pela floresta.
Os sapatos começaram a calejar-lhe os pés. Ele os tirou imediatamente. Foi picado pelas formigas, pisou em cactus, tentou livrar-se dos espinhos maiores, mas teve de continuar caminhando, pois a penumbra sob as árvores tornava-se cada vez mais densa, e havia os perigos noturnos da selva.
Sentia agulhadas finas e dores fortes nas plantas dos pés, mas não podia mais calçar os sapatos, pois os pés incharam. Subitamente estranhou que uma vala dividia o caminho. "Quem teria interesse em cavar uma vala no meio da selva?" pensou.
Mas parou imediatamente de caminhar ao lembrar-se do aviso dos irmãos e do barqueiro: "Quando encontrar uma vala na estrada, principalmente se for em terra mole, afaste-se dela, pois é o caminho da sucuri."
Ele ainda estava sob o efeito da lembrança dessas palavras, quando a gigantesca cobra apareceu à sua frente. A uma distância de menos de dois metros, a sucuri ergueu a cabeça até a altura do rosto de Daniel, e começou a fazer movimentos com o corpo, tentando hipnotizá-lo, como fazia com todas as suas vítimas, antes de atacá-las.
Paralisado pelo medo, o missionário começou a clamar angustiosamente em espírito, pedindo que o Senhor o livrasse daquele monstro pavoroso. O tempo parecia haver parado em toda a selva. Um suor frio descia lentamente da testa e ao longo da espinha dorsal de Daniel, e ele permanecia ali, parado diante da morte, clamando insistentemente a Deus.
Súbito, todo o corpo da sucuri estremeceu; como se tivesse visto algo que a amedrontara, a cobra desviou a cabeça para o lado, movimentou rapidamente seu enorme corpo desviando-se do seu caminho habitual, e sumiu velozmente por entre as árvores.
SALVO DE SER DEVORADO POR UMA ONÇA
Daniel glorificou o nome do Senhor por aquele grande livramento, e reiniciou sua viagem, sentindo a alma leve e o coração cheio de júbilo e de gratidão a Deus!
Quando conseguiu alcançar uma vereda um pouco mais larga, a noite já se apossara completamente da floresta, e a escuridão era total. Caminhando descalço, Daniel temia pisar em algum inseto venenoso ou ser picado por uma cobra.
De repente o urro de uma onça cortou o silêncio da noite. O missionário parou e esperou que a fera desse outro sinal. A onça urrou outra vez, em um lugar mais próximo dali. Subitamente começaram a ser ouvidos os latidos de um cão, mas logo transformaram-se em ganidos, e em seguida silenciaram.
Daniel continuou a caminhar, os olhos prescrutando a densa escuridão da selva, os ouvidos atentos aos ruídos noturnos, esperando a onça urrar a qualquer momento.
Inesperadamente, uma pequena luz movimentou-se por entre as árvores, e começou a se aproximar dele. Era uma lamparina de querosene. O homem que a conduzia olhou desconfiado para Daniel, mas logo recobrou a confiança ao ser cumprimentado pelo missionário.
Após trocarem algumas palavras, o homem ergueu a lamparina acima de sua cabeça e apontou para os restos sanguinolentos de um animal que jazia morto há alguns metros dali, e disse:
- Era o meu cachorro. Ele nunca enfrentou antes a onça diretamente. Semore a temeu. Mas hoje algo o levou a enfrentar a fera até a morte.
Imediatamente Daniel entendeu que Deus usara aquele cachorro para livrá-lo das garras assassinas da onça. Após convidar o missionário a hospedar-se em sua casa, o caboclo falou:
- O senhor deve ter uma arma bem possante, pois só estando bem armado alguém teria coragem de andar por esses lados, cheios de cobras e onças.
- Sim, realmente eu ando bem armado. A minha arma é esta - respondeu Daniel, mostrando-lhe a Bíblia.
Caminharam até chegar diante de uma casinha humilde, de paredes de barro e de varas (taipa), com teto de palha. Ali morava aquele homem com a esposa e filhos. Eles arranjaram água para o missionário lavar os pés, ajudaram-no a se livrar dos espinhos maiores (no outro dia, o ajudariam a tirar os menores), prepararam-lhe uma rápida refeição e providenciaram um lugar onde ele pudesse repousar aquela noite.
Naquela casa o Senhor mais uma vez livrou Daniel de ser picado por uma cobra. No dia seguinte, após presentear o caboclo com uma Bíblia, Daniel prosseguiu sua viagem, sabendo que deixara a semente do Evangelho plantada naqueles corações.
Daneil caminhou pela floresta até o anoitecer, quando parou para dormir em uma cabana sem teto. A chuva que caiu naquela madrugada deu-lhe a impressão de que a água arrastaria a cabana. Porém seu coração estava tranquilo, pois ele sabia que as Bíblias estavam bem protegidas dentro da mala.
Mas as roupas que usava só secaram algumas horas depois, quando ele reiniciou a viagem até chegar a um lugarejo, onde um pequeno grupo de irmãos o recebeu.
Naquele vilarejo, Daniel realizou cultos ouvindo urros de onças e gritos de outros animais bem próximo da casa onde os irmãos se reuniam. Segurando em uma das mãos a lamparina de querosene e empunhando a Bíblia com a outra, Daniel Berg lia a Palavra de Deus diante da pequena congregação. Por não dispor das mãos livres, os mosquitos picavam o seu rosto, pescoço e braços.
Foi em um desses cultos que ele contraiu malária. Debilitado e sentindo febre e calafrios por todo o corpo, o missionário ficou acamado durante vários dias. No intuito de reanimá-lo, os irmãos chegaram até a preparar-lhe um jantar especial, cujo prato principal era uma das iguarias da selva: um macaco cozido!
Agradecendo a gentileza dos irmãos, o missionário confessou estar sem apetite...
Alguns dias depois, Daniel foi reconduzido a Belém em companhia de dois irmãos (um deles fora enviado por Gunnar Vingren, que dias antes recebera uma carta de Daniel, onde este lhe falava do seu estado de saúde).
Os três viajantes atravessaram a selva, foram transportados pelo mesmo barqueiro que fizera a travessia de Daniel Berg, chegaram em terra firme e caminharam até a estrada de ferro onde Gunnar Vingren os esperava.
Daniel foi conduzido à casa de Vingren, e lá ficou, tendo crises de febre até que o Senhor o curou. (Alguns meses depois, o missionário tornou a contrair a doença, mas, então o Senhor o curou de uma vez por todas.)
OS CAÇADORES DE ESMERALDAS RESGATADAS PARA O TESOURO DO CÉU
Deus ainda usou inúmeras vezes o seu servo no meio dos perigos da selva, dos rios caudalosos e de homens sanguinários, até chamá-lo, em 1963, para as mansões eternas. Mas nem o naufrágio que sofreu, pela correnteza de um perigoso rio, ao navegar em uma pequena canoa, nem as dificuldades enfrentadas durante as viagens no barco Boas-Novas, nem as palavras e os gestos ameaçadores que lançaram sobre ele e Vingren, quando visitavam a ilha de Marajó, fizeram-nos desistir do empreendimento maravilhoso de levar a Palavra de Deus aos corações de muitos daqueles que viviam em pequenas cidades e entre rios e florestas daquelas regiões longínquas.
Na condição de evangelistas e primeiros colportores pentecostais no Brasil, Daniel Berg e Gunnar Vingren avançaram pelas cidades e pelas selvas adentro, alcançando casas isoladas e lugarejos de difícil acesso; caminharam centenas de quilômetros a pé, navegaram pelos rios do Amazonas e do Pará, sob o sol, sob a chuva, de noite e de dia, por veredas estreitas e mato fechado, enfrentando os mosquitos transmissores da malária, os perigos e as surpresas da floresta e do coração do homem mau, realizando um trabalho superior ao de Fernão Dias Paes Leme, o bandeirante caçador de esmeraldas, pois pescavam almas preciosas para o reino de Deus.
À semelhança do grande bandeirante, aqueles dois missionários também desbravaram o desconhecido, mas tão-somente à procura de almas, de "esmeraldas" resgatadas das impurezas do mundo para serem conduzidas ao Tesouro do Céu. E deles pode-se dizer o mesmo que Olavo Bilac disse de Fernão Leme:
"Cada passada sua era um caminho que surgia." Pelas veredas do Evangelho dificultosamente abertas, germinaram, como sementes férteis, as gotas de suor de Daneil Berg e Gunnar Vingren, suas lágrimas, a fome, as vigílias. E hoje, sob as mãos abençoadoras de Cristo, quando a Assembleia de Deus cresce em todo o Brasil e neste ano de 2011 comemorará o seu centenário, o Espírito Santo reascende continuamente nos corações de todos os pentecostais do Brasil, a esperança de, um dia, nas ruas da Jerusalém Celestial, podermos nos encontrar e abraçar os nossos irmãos Daniel Berg e Gunnar Vingren, que, para levarem a semente de vida eterna ao coração de milhares de brasileiros, enfrentaram corajosamente os imensos desafios das cidades e os grandes perigos das selvas amazônicas.
Jefferson Magno Costa
nossa que linda essa historia do nosso amado irmã Daniel e sei que e so um pouquinho do que viveram aqui,Deus tenha mizericordia de nos que moramos praticamente dentro ds igrejas temos todos os tipos de estudo biblicos e damas tão pouco valor a uma coisa tão importante que e´viver, leva a palavra de Deus.Que posamos buscar mas de Deus em oração e suplica para ele levantar mas outros tanto aqui no Brasil e fora daqui tambem de DANIEL E GONNAR.........
ResponderExcluirGrandes homens de DEUS,ouve no passada, há no Presente, e haverá no futuro ,nosso Deus é o mesmo e quer usar de maneira especial a muito mais para isto temos que nos humilhar,confiar em sua providência, e nos entregar completamente alma corpo e coração, então aquele que crer que ele pode todas as coisas vera e sentirá o seu mover.
ResponderExcluirGrandes homens usados por Deus,houve no passado,há no presente e haverá no futuro,nosso Deus é o mesmo ele não mudou ele é imutável mais requer que nos doamos ao seu amor, como nosso o irmão Daniel Berg e Gunnar Vingren se doaram corpo alma mente e coração a serviço do Deus vivo, crendo em sua providência, passando pelo deserto com a certeza de que água estava com eles, nunca desistiram e venceram pois em Cristo Jesus somos mais que vencedores Deus esta procurando no meu do seu povo homens destemidos como Daniel Berg e Gunnar Vingren que não mediram distância para fazerem a obra que o senhor Deus havia entregado em suas mãos, grande foi a luta que eles enfrentaram mais maior foi a vitoria que eles alçaram.Hoje a Assembleia de Deus constituí de aproximadamente 52,5 milhões de membros no mundo,com maior número de membros é o Brasil com 8,4 milhões de membro,imagine você se aqueles homens tivesse se encovardado não teriam conseguido resgatar tantas almas para Cristo, mais eles não se encovardaram eles permitiram ser cheios do espirito Santo e por amor a DEUS e a Sua obra enfrentar mares e oceanos perigos eminentes pois nestas viajes havia muitas pessoas doentes dentro dos navios, o índice de malária entre outras doenças era elevadas nesta década de 90,mas o Senhor Deus seu escudo e broquel foi com eles ate o fim os livrando, operando milagres e maravilhas,pois eles confiariam em Deus, bendito é o homem que confia em Deus pois o Senhor Jamais o desamparara e todas as promessas aos teus filhos (servos) são cumpridos pois o Senhor é um Deus imutável o que ele fala ele cumpre para aqueles que nele crer e tem o seu prazer na palavra do Senhor que a alma anseia pelo criador, e a missão de obedecer for uma chama viva que não se apaga do seu coração.
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